The Bolsonaro Moment.

Reprodução: Pense Grátis

Antes de ler esse texto, queria te dizer uma informação pessoal sobre a pessoa que o escreve: ela é cristã. Dito isso, prossigamos.

Há muitas associações a serem feitas sobre o processo eleitoral que vivemos. Porém, tudo que ficou mais evidente para mim, que acabei de me formar em Relações Públicas, é como essas eleições destruíram o poder dos grandes conglomerados midiáticos, como esses se posicionaram e como as fake news destruíram o marketing político tradicional. Vamos tentar falar sobre cada um deles.

De um lado,  tínhamos um candidato com um currículo extenso. Um político natural. Professor, vindo de uma das maiores universidades da América Latina, gestor, mas que amargava a tristeza de pertencer a um partido associado a corrupção. O Lattes de Haddad não valeu de nada. Ele perdeu. No caminho contrário, temos Bolsonaro. Deputado e vereador por quase 30 anos, carregava frases prontas que  durante anos o colocaram como mito. Agressivo, dúbio entre o liberalismo e o conservadorismo, conquistou a graça de milhões de brasileiros e teve quase 58 milhões de votos. O deputado só não ultrapassou o ex presidente Lula por 497.195 votos.

Como entendermos, então, essa bagunça política que nosso país virou prestando atenção em seu público religioso e lembrando de "The Waldo Moment", episódio de cunho político de Black Mirror? Simples: é só lembrarmos que quando um povo está amargo e decepcionado, aquele que primeiro se intitula como herói, leva o prêmio. E é nisso que o episódio da série inglesa se baseia: cansado de discursos políticos que não saiam do campo das ideias, o povo de uma determinada região elege como seu representante Waldo, um desenho animado sem papas na língua. Para mim, o ponto de maior semelhança entre Waldo e Bolsonaro é a escolha dos meios. Ambos, usaram as redes sociais como seus mecanismos de comunicação. E sobre esse episódio, quero que você se lembre de algo que aconteceu com Lula, quando este perdeu para Collor.

A candidatura de Luis Inácio Lula da Silva, em 1990, sofreu um grande baque. O presidenciável foi acusado de pedir a sua ex mulher que abortasse a criança que esperava em seu ventre. E para piorar a situação, Lula já havia passado por uns bocados com a edição de um debate na Rede Globo. Dito e feito, a história está aí para ser lembrada: Lula perdeu a eleição para o caçador de marajás e também de poupanças. Mas, voltando anos depois, vemos Ciro Gomes também ter sua candidatura derrubada pela mídia em 2002 (assista Arquitetos do Poder para entender essa afirmação). E quase três décadas depois, vemos uma contradição total: a mídia não tem mais força para derrubar e nem levantar nenhum candidato.

Mesmo com a Rede Record apoiando de forma perceptível o candidato Jair Bolsonaro, suas aparições não interferiram, ao meu ver, em seu número de votos. As pessoas, simplesmente, pararam de acreditar na mídia. Denúncias graves que antecederam a votação final passaram despercebidas pelos seus eleitores e deram mais força ao movimento #MarketeirosdoJair. Que uniu milhares de pessoas nas redes sociais que declararam abertamente voto no candidato do PSL e que faziam de tudo para elegê-lo.

Mais interessante do que todo esse movimento de hoje, é o fato de que Bolsonaro não mudou. Mesmo após o triste atentado que sofreu, o futuro presidente continuou a defender seus pensamentos polêmicos. Todos ouvimos durante esse processo eleitoral, as já conhecidíssimas e assustadoras declarações do deputado. Eu tenho certeza que você conhece cada uma delas, se duvidar. Porém, em uma entrevista a Record, ele negou as acusações de ser racista, machista e homofóbico. Ah, finalmente: a mudança de discurso aconteceu. Mas, não: uma semana antes do domingo eleitoral, o então candidato afirmava que as políticas afirmativas eram a causa do preconceito contra negros, gays, mulheres e nordestinos no país.

Ou seja, Bolsonaro não mudou. Ele foi amenizado por um péssimo processo de media training (que inclusive, ignorou num primeiro momento a iminente violência de alguns eleitores), mas continuou com seu discurso de combate minoritário e fim do marxismo cultural. Algo que não aconteceu com Lula. Se estudarmos o Lula dos anos 80, que perdeu inúmeras eleições, e o Lula Paz e Amor construído por Duda Mendonça e cia veremos que houve uma mudança estrondosa no candidato. Bolsonaro, não. Se elegeu sem mudança. E isso é muito bem explicado, sem nenhum olhar teórico profundo: seu discurso é semelhante aos de muitos. Bolsonaro representa todos aqueles que se sentem ofendidos por tudo que o PT deixou a tona. E, não, não estou falando sobre corrupção. Estou falando do combate a minorias como prioridade fundamental de seu discurso. E falando em minorias, qual grupo sente maior medo delas? Isso mesmo: os evangélicos.

Infelizmente, política e religião se misturaram de uma forma absurda no lado sul do ocidente. A Bíblia, livro o qual acredito desde Gênesis 1 a Apocalipse 22, teve seus salmos e cânticos trocados por declarações e tuítes do quase presidente. Ele se tornou o baluarte daqueles que não aguentam mais ver suas crenças desrespeitadas por parada e casamentos gays. É triste o fato de que enquanto irmãos nossos morrem em países do Oriente Médio por simplesmente carregarem suas bíblias, nós estamos aqui elegendo um homem como futuro salvador. Sim, esse foi o grande ponto do movimento evangélico bolsonarista: eles colocaram todas as suas expectativas espirituais num capitão humano. Tiramos Jesus, o verdadeiro Salvador de cena, e trazemos um homem que toma para si o título e também o nome de Messias.

O otimismo messiânico brasileiro é tão contraditório que se, você, caro ateu que não acredita em uma palavra sequer dos escritos sagrados, se debruçar sobre a história mais sobrenatural da bíblia, entenderá que ela não chega aos pés da adoração cristã a Bolsonaro. Quando paramos para estudar e interpretar a sagrada escritura, vemos que estamos num momento ápice de todo o planeta. Agora, só restam para aqueles que acreditam na visão cristã, aguardarem o Seu Senhor nas nuvens do céu. Biblicamente, não existe esperança espiritual e nem material para o mundo além da Canaã Celestial. E aí está o começo do problema: por que temos o grande apoio a um homem como o emanuel da nação se a esperança está em Jesus? Contradições que carregaram toda a eleição de Bolsonaro.

Por fim, aquele que começou como um meme em um programa televisivo, subirá ao poder no próximo ano. Um presidenciável que se elegeu com a ajuda de fake news, jogou o marketing político tradicional no lixo e chamou o nacionalismo para si. Resta, para todos nós, independente de tudo, acompanharmos um governo construído e firmado no Twitter, mas que terá consequências muito maiores que 280 caracteres.


Fontes (sem ABNT pq não sou obrigada)
http://www.internetlab.org.br/pt/opiniao/black-mirror-the-waldo-moment-s02-e03-midias-sociais-e-atores-apoliticos/
https://www1.folha.uol.com.br/poder/2018/10/vamos-acabar-com-coitadismo-de-nordestino-de-gay-de-negro-e-de-mulher-diz-bolsonaro.shtml
https://observatoriog.bol.uol.com.br/noticias/2018/10/em-entrevista-ao-jn-bolsonaro-diz-que-agressores-de-lgbts-devem-ter-pena-agravada

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